Segundo o que presenciamos no Evangelho de Lucas, ou seja, a revelação do Pai – e o Pai se revela no Filho – saboreamos um Deus, que é tomado de compaixão, misericórdia e amor por cada um de nós. Presenciamos um Deus com entranhas de misericórdia, sempre disposto a correr ao nosso encontro e nos encher de beijos e abraços, independentemente de nossas misérias e pecados, desde que estejamos dispostos a mudar de vida.
Frente a tanto amor, a tanta misericórdia, a tanta compaixão, por que não conseguimos agir com piedade, compaixão e misericórdia com aqueles que nos ofendem e nos machucam? Ninguém dá o que não tem. Ora, se recebemos amor, misericórdia, compaixão de Deus, por que não conseguimos ser isso tudo para os nossos irmãos e irmãs?
Queiramos ou não, somos obrigados a admitir: somos especialistas em tirar ciscos dos olhos dos outros, enquanto que uma floresta existe dentro dos nossos [olhos]. É duro admitir, mas esta é a verdade. Mas por que isso se o Senhor não age assim conosco? Como podemos ter estas reações? De onde vem essa predisposição para agir assim: cheios de compaixão para conosco e tão cruéis para com os outros? Será que somos maus? Será que somos impossibilitados de agir com misericórdia diante dos que erram?
Na verdade, é preciso que entendamos uma coisa muito importante: tudo que existe é bom, pois tudo foi criado por Deus e de Deus não pode vir nada que não seja bom. O ser humano não é bom, mas muito bom, como disse Deus no início da criação, logo após criar o ser humano. Para dizer: não existe ser humano ruim; existe ser humano com atitudes ruins, com índole ruim, com uma criação ruim, mas, essencialmente, bom, por ter sido criado por Deus!
Em nossos relacionamentos – sejam com quem for – sempre depararemos com pessoas que, diante de posturas, nos deixarão tristes e algumas nos deixarão sem paz interior, com verdadeira raiva. Também nossas reações diante delas podem ser completamente diferentes. Entendamos. Não existe uma vacina na face da terra que nos deixe indiferentes com relação a tudo que as pessoas fazem de errado – fruto da fraqueza – em relação a nós ou aos outros. Nós vamos sentir e muito. Nossa reação será imediata. Até aí tudo bem.
O problema nunca estará naquilo que viermos a sentir, porque não temos domínio sobre os nossos sentimentos; a questão-chave estará no que vamos fazer com tais sentimentos, sejam quais forem eles: bons, ruins; maravilhosos, péssimos, santos ou profanos. Sentir nunca foi pecado; pecado é consentir com algo que não condiz com a nossa vida de cristãos, principalmente o julgar e o condenar as pessoas, querendo arrancar o cisco do olho do outro. Cego não guia cego!
Quando observamos algo na vida de uma pessoa – algo de ruim que o outro tenha feito – será uma virtude de profunda caridade se formos ao encontro dela, com misericórdia, propondo-nos a ajudá-la; se isso que observo não me tira a paz. Agora, quando observo defeito na vida do meu irmão e isso me tira a paz e não me controlo, no sentido de não deixar de ir e meter o “dedo na ferida”, na verdade, o que quero é combater no outro o defeito que não tenho coragem de combater em mim, pois o mesmo defeito que o outro tem eu também tenho; contudo, dói menos combatê-lo no outro. Então, ao agir assim, deixo a “trave” em meu olho e vou ao encontro do “cisco” do olho do outro.
Quando algo no meu irmão me tira a paz e me impede de fazer a caridade, aí há um grande sintoma daquilo que tenho de mudar em mim, ou seja, a trave que tenho que arrancar do meu olho e que quero retirar do olho dele.
O irmão possui a capacidade de nos mostrar as nossas enfermidades sem nos dizer uma palavra; basta percebermos nele aquilo que nos tira a paz! Se o “cisco” do olho do outro me tira a paz, é ele me dizendo que tenho de arrancar a “trave” no meu olho.
Padre Pacheco - Comunidade Canção Nova
Adalberto Lima
Vocacionado Diocesano
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